Acupuntura e a questão multiprofissional: em defesa da Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares no SUS

De Maria Eneida de Almeida, Biomédica Especialista em Acupuntura pelo Conselho Regional de Biomedicina 1ª. Região e Doutora em Saúde Coletiva pelo Instituto de Medicina Social da Universidade do Estado do Rio de Janeiro.

É inegável a contribuição que a Medicina Chinesa trouxe para o Ocidente. Este conhecimento milenar alcançou uma grande projeção em função de crescente acesso dos países à informação legítima, por meio de aproximações institucionais da OMS, desde a década de 1960. A partir de 1980 é fato a aproximação da sociedade em busca de tratamentos menos medicamentosos e a crescente aceitação da ciência ocidental. A “Estratégia da OMS sobre Medicina Tradicional” é uma política pública internacional, que fundamenta importante documento com diagnóstico, desafios e potencialidades da Medicina Chinesa. Esta política responsabilizou a própria OMS a conservar e proteger seus conhecimentos, registrados em 2010 pela UNESCO, instituindo a “Acupuntura como Patrimônio Cultural Intangível da Humanidade”.

A Acupuntura é vigente na China há 4 mil anos, sendo disseminada por toda Ásia, Europa e América do Norte. No Brasil, foi introduzida na década de 1950 pelo Prof. Frederico Spaeth, cuja trajetória profissional foi pautada na determinação e luta incansável pela regulamentação da profissão e formação multiprofissional. Estimativas da OMS em 2002 eram de que a Acupuntura era utilizada em 78 países e, em 2008, estimava-se em 130 países, com perspectivas de franca expansão. É crescente sua procura pela sociedade ocidental, bem como o comprometimento governamental.

Este método terapêutico tem sido exercido por diferentes categorias profissionais. Em muitos países existem leis que regulamentam a prática, bem como o sistema de formação e educação. EUA, França, Nova Zelândia, Inglaterra, entre outros, já têm sua prática multiprofissional regulamentada. É fato que coexistem conflitos de classe e dilemas institucionais em alguns países, no que tange o direito de executar esta medicina, mas há que se ter cuidado para que equívocos não sejam cometidos. No Brasil, a questão multiprofissional foi institucionalizada pelo Ministério da Saúde na Portaria 971, com o lançamento da “Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares/PNPIC”, ressaltando a Integralidade no atendimento multiprofissional e inclusão das outras medicinas que contribuem com a saúde das pessoas e da coletividade. Atualmente, todos os acupunturistas no Brasil estão em processo de regulamentação profissional.

Na realidade, há um descompasso entre o olhar da medicina ocidental e das demais profissões da área de saúde, no que diz respeito à capacidade de se priorizar a saúde e não a doença, priorizar a capacidade de olhar, ouvir e conhecer o doente, ao invés de priorizar a pesquisa da doença e seus respectivos medicamentos. Este descompasso tende a interferir na prática da Medicina Chinesa; entretanto, a própria OMS reconhece que investir em doença não trouxe saúde para a humanidade e estimula a visão de se investir em outro olhar, com promoção da saúde e, assim, evita-se a doença.

Em defesa dos direitos adquiridos pelas profissões que já têm seus Códigos de Ética e direitos regulamentados em seus Conselhos Profissionais, no Ministério da Saúde e no Ministério do Trabalho, com reconhecimento da habilitação na área da Acupuntura, sejam elas: biomedicina, fisioterapia, enfermagem, farmácia, fonoaudiologia, psicologia, educação física e odontologia, é importante enfatizar que a Medicina Chinesa e a Medicina Ocidental são racionalidades médicas distintas entre si, são sistemas médicos completos, bem como a Ayurveda, a Homeopatia, a Unani e a Antroposofia.

Neste sentido, não há que se confundir e reduzir-se o que é, de fato, a Acupuntura, por qualquer desejo de poder corporativo. Os dados são sérios. São oficiais, nacionais e internacionais, bem como acadêmicos em essência. A indiferença da trajetória da Medicina Chinesa no Ocidente poderia ser causa de um imenso equívoco, que iria contrariar toda a história e a filosofia oriental, a política de saúde internacional e nacional. Neste campo, não existe tábula rasa.