A lentidão da Anvisa
O Estado de S. Paulo – 29/12/2011
Tão ágil para regular a venda e exposição de produtos pelas farmácias; para exigir receitas, em duas vias, na compra de medicamentos antes liberados; para recomendar medidas de contenção da venda de determinados remédios – a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) é notória pelos atrasos na análise e autorização para uso de novos medicamentos, o que, por lei, deveria ser feito no prazo de 90 dias. Há hoje mais de mil solicitações de análise para registro de remédios e produtos de saúde encalhadas no órgão regulador e o número só tende a crescer.
Cansadas de esperar, as empresas recorrem com frequência à Justiça, estimando-se que de 6 a 12 mandados de segurança sejam expedidos por semana contra a Anvisa. Para aliviar essa dor de cabeça, a diretoria do órgão aprovou a criação de duas filas distintas: uma delas para as solicitações relativas a produtos mais simples, com menos riscos, as quais teriam andamento mais rápido; a outra para as requisições que seguiriam o caminho rotineiro, a não ser que sejam objeto de ações na Justiça. Esse tratamento desigual acaba favorecendo algumas empresas e ferindo o princípio de equidade.
A lentidão da Agência não causa prejuízos apenas para os fabricantes, como afirmou Evaristo Araujo, diretor da Associação Brasileira das Empresas Certificadas (Abec). “Se não há competição no mercado, os preços se mantêm altos, o que não é bom nem para o consumidor nem para o governo, que é um dos maiores compradores de produtos de saúde para o SUS.” Os Estados arcam igualmente com pesadas despesas na aquisição de medicamentos não só para atender à demanda de seus hospitais e postos de saúde, como para cobrir a deficiências do SUS. No Estado de São Paulo, por exemplo, esses gastos praticamente dobraram em quatro anos.
Deve-se acrescentar que, muitas vezes, faltam nas farmácias remédios que incorporam os últimos avanços para tratamento de determinadas moléstias. Não é incomum que hospitais, empresas de planos de saúde e pessoas doentes ou seus familiares encomendem, no exterior, produtos farmacêuticos ainda não disponíveis no mercado nacional.
Se é necessária a análise de medicamentos pelo órgão competente antes de eles serem colocados no mercado, o processo não precisaria ser tão complicado como o adotado pela Anvisa. O primeiro passo para o registro é a obtenção de um documento atestando boas práticas de fabricação, que, desde um ano e meio atrás, só é concedido após vistoria nas indústrias. A inspeção pode ser feita aqui ou no exterior, ou seja, nas matrizes ou fábricas mantidas em outros países pelas empresas farmacêuticas internacionais.
Contudo, a ordem cronológica de entrada dos pedidos de registro não é obedecida, como reconhece Jaime Oliveira, diretor da Anvisa. A explicação para isso é a racionalização de custos. Hoje, como disse Oliveira ao Estado, uma equipe vai a um país para análise de apenas uma fábrica. A ideia é aproveitar a viagem para vistoriar também indústrias próximas. Os registros que dependerem de fábricas que não estiverem nas proximidades continuarão pendentes. Para agilizar o processo, o diretor da Anvisa defende que autoridades sanitárias estaduais e municipais também possam fazer vistorias em países estrangeiros, o que importaria em gastos não autorizados. Parece mais realista o credenciamento, pela Anvisa, de laboratórios públicos para essa tarefa.
Concursos são previstos para aumentar o quadro dos analistas da Anvisa em 2012, mas o prognóstico não é bom, como reconhece Maximiliano D”Ávila Cândido, procurador da Anvisa. A seu ver, “é preciso mudar a lei”, para evitar ações judiciais, que significam ônus para o Estado e a Justiça. Ele não especificou qual seria um prazo razoável para registro de um novo medicamento.
Estima-se que seriam necessários quatro anos para atender a todas as solicitações acumuladas feitas pelas empresas e que dormitam na Anvisa, que sofre de má gestão, um mal crônico da administração pública brasileira.