Folia sem espaço para o HIV
O Globo – 18/02/2012
A Aids já não tem a cara feia de três décadas atrás. Nos anos 1980 e 1990, infectados pelo HIV definhavam a olhos vistos e morriam rapidamente, além de padecer sob forte carga de preconceito. O Brasil enfrentou a doença com seriedade e competência. Não eliminou a discriminação nem impediu a transmissão do vírus ou pôs fim às mortes, mas obteve resultados positivos o suficiente para destacar-se no cenário internacional com suas políticas públicas de prevenção e tratamento. Com o avanço da medicina, em especial o surgimento de eficientes antirretrovirais, democratizou o acesso aos novos medicamentos, promovendo a distribuição gratuita do coquetel, o que ampliou o sucesso no combate ao flagelo. Infectados ganharam sobrevida. Melhor: com mais qualidade. O Brasil continua como exemplo, mas o fenômeno hoje é mundial. Tanto as mortes como as transmissões entraram em declínio. Em relação ao pico alcançado em 2005, o número de óbitos caiu 18% em 2010. O de novas infecções recuou 21% na comparação com a epidemia de 1997. Mas o progresso não pode, de modo algum, ser motivo para acomodação. Há que perseguir o ideal e enfrentar os desafios que surgem a cada dia. Para este carnaval, por exemplo, o Ministério da Saúde preparou vídeo destinado a alertar casais gays para o risco do contágio. A peça não pôde ser exibida na tevê aberta. Com a restrição a locais fechados, a campanha perdeu força. A distribuição de camisinhas nas escolas é outra dificuldade. As resistências a diálogo aberto e franco com a juventude apresenta conta macabra. Sem ter vivido a época do horror da doença, a geração de até 30 anos está mais vulnerável. A desinformação é tanta que 85,05% dos internautas que acessam a rede social do Ministério da Saúde destinada ao público jovem o fazem atrás de respostas para dúvidas relacionados ao HIV e a outras doenças sexualmente transmissíveis. Sinal ainda mais preocupante é que a taxa de infectados entre 15 e 24 anos passou de 8,1 para cada 100 mil habitantes, entre 2005 e 2010, para 9,5. No Distrito Federal, a escalada ainda foi mais íngrime: de 5,7 para 10,3. Coordenadora do Instituto Vida Positiva, Vick Tavares alertou no Correio que os jovens de hoje “têm mais medo da gravidez do que da Aids”. Também em entrevista ao jornal, a infectologista Marinella Della Negra, especializada no tratamento de crianças e jovens soropositivos, destacou a necessidade de esclarecê-los sobre a gravidade da doença e as implicações do tratamento: “Tomar remédio a vida inteira, todos os dias, não é legal. Existem efeitos colaterais”. Em dias de folia e libido em alta, todo cuidado é pouco e informação nunca é demais. A profusão e a convergência de mídias facilita sobremaneira a transmissão de conhecimentos nos dias de hoje. Também são forte arma contra tabus e preconceitos. Deixar que a ignorância ameace a saúde e a vida é dar guarida ao retrocesso. Há que, ao contrário, abrir caminho, inclusive nas escolas, para que o sucesso brasileiro no enfrentamento ao HIV continue a ser motivo de orgulho para o país. De imediato, que todos ponham na cabeça de uma vez por todas: sexo seguro só com camisinha.