Cebes pactua aliança com a CNBB em defesa da Saúde Publica
Para avaliar a Campanha da Fraternidade e as estratégias futuras da luta pelo direito à Saúde, a CNBB convidou para um Seminário entidades parceiras, como o Grito dos Excluidos, Cebes, Núcleo 21, INESC e outras. No evento também estiveram presentes diversos representantes das pastorais da saúde e assessores.
Com a escolha do tema Fraternidade e Saúde Pública, a Campanha da CNBB, em tese, esgotaria no final da Semana Santa, entretanto houve consenso sobre a necessidade de sua continuidade de forma a dar consequência a toda a mobilização que vem sendo feita e assim levar às autoridades nacionais instituídas os resultados sob a forma de demandas e propostas.
Nesse momento em que a CNBB adere ao Movimento Nacional por 10% para a Saúde, Dom Leonardo Steiner, secretário geral da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, anunciou o engajamento de toda a Igreja na coleta das assinaturas para o PL de iniciativa Popular.
O Seminário contou com a participação de importantes nomes da luta pela Reforma Sanitária que debateram os grandes desafios para a consolidação do SUS. O Cebes esteve presente com Ana Costa, Jairnilson Paim, José Noronha, Ligia Bahia, Gilson Carvalho, Roberto Nogueira, José Moroni, Guilherme Delgado, José Moroni e Manuela Carvalho do Núcleo de Cascavel. Os debates ocorreram em torno dos temas: acesso à saúde e integração da prestação de serviços de saúde; financiamento público em saúde; gestão dos recursos em saúde; caráter público x caráter privado da saúde; educação para a saúde: formação profissional e hábitos saudáveis.
Na abertura do Seminário, o secretário geral Dom Leonardo Steiner ressaltou a necessidade de mais fiscalização dos recursos na saúde e enfatizou o papel da Igreja nesse processo, por meio de suas representações nos Conselhos de Saúde. Ao analisar a situação da saúde no Brasil, ele relata a unanimidade da Assembléia dos Bispos na avaliação da insuficiência dos recursos financeiros públicos destinados para o SUS, justificando a razão da adesão da CNBB ao Movimento pelos 10%.
A economista Luciana Mendes, do IPEA, discorreu sobre a integração da prestação de serviços, trazendo alguns dados referentes ao acesso que evidenciam as lacunas dos serviços públicos e o crescimento do setor privado. Nesse contexto ela afirmou: “enquanto não houver regulação entre o setor público e o privado, não iremos avançar, e estaremos sendo reféns da lógica do mercado”. Ela valorizou os avanços conquistados nas duas últimas décadas e ao mesmo tempo mostrou que ainda há muita desigualdade no acesso, salientando distorções de diversas naturezas, entre as quais ela afirma “as pessoas que tem planos de saúde estão cada vez mais usando o SUS”.
O Prof. Jairnilson Paim, que também falou sobre o acesso à saúde e integração da prestação de serviços expôs sua preocupação com a atual conjuntura do SUS. “O SUS está sob ameaça sobre vários aspectos, há um subfinanciamento público e uma subregulação no privado”, disse ele. Ele apresentou dados relevantes como: 70% dos hospitais no Brasil são privados, menos de um terço dos mamógrafos no Brasil são públicos, os leitos hospitalares públicos no Brasil estão diminuindo e há evidências de que a população tem buscado mais a atenção básica. Sobre esse momento de agregação de forças sociais, Jairnilson salientou a necessidade de avançar na consciência sanitária crítica para lutarmos para que os direitos preconizados na Constituição se concretizem, de fato.
O tema do financiamento foi debatido por Gilson Carvalho e o diretor do Cebes, José Noronha. Gilson Carvalho destacou a importância da população em geral entender que a Saúde Pública é dela, que ela paga e financia o SUS, a todo o momento, por meio de todo o tipo de imposto. “Para que construir uma casa nova se temos uma boa casa para ser reformada, que é o SUS?”, indaga Gilson sobre a crescente procura da nova classe média por planos de saúde, que muitas vezes não atendem às suas necessidades.
Noronha ressaltou a dinâmica do crescimento do setor privado, a importância do investimento das famílias nas contas da saúde e os impasses a serem enfrentados para a retomada do SUS constitucional e controlar as “serpentes que já saíram dos ovos”, ou seja, o mercado já tomou conta da saúde nacional. Ele também alertou que nenhum País que tem a saúde nos moldes universais mais eqüitativos, principalmente os países europeus do pós-guerra, tem uma participação privada na saúde tão grande quanto o Brasil.
Roberto Nogueira ressaltou os graves problemas de gestão do sistema que não se restringem ao que alguns movimentos sindicais priorizam na critica às Fundações e OSs e chama a atenção para que a gestão seja abordada de forma mais ampliada, tendo o usuário como centro e objeto de sua construção. De forma convergente, Manuela Carvalho discutiu a questão da gestão do trabalho e as deficiências, valores e os impasses das diversas categoriais profissionais da saúde.
Para José Moroni, que falou sobre o caráter público x caráter privado da saúde, não deveria haver nenhuma forma de sistema privado na saúde e educação. Ele colocou que a relação promíscua entre os dois setores, público e privado, tem atingindo a ponta do sistema, e citou os aparelhos em hospitais como exemplo. Ele também falou sobre a prática recorrente em hospitais públicos de se “captar” clientes, realizada por muitos médicos, que hoje buscam seus clientes particulares em hospitais públicos.
Ainda nesse tema do público x privado, a Prof. Ligia Bahia, da UFRJ, falou de três bandeiras importantes a serem levantadas: a da ampliação da cobertura dos planos de saúde, a necessidade de lutar contra a dupla porta e contra os planos de saúde privados para o funcionalismo público, que ela ressaltou como um absurdo a ser combatido.
O médico André Luiz, membro da Pastoral da Saúde e representante da CNBB no Conselho Nacional de Saúde, insistiu que os hábitos saudáveis constitui importante tema nesta discussão. Segundo pesquisa da Universidade de Stanford, que o médico apresentou, mais de 50% dos problemas de saúde estão relacionados com a má alimentação. O debate direcionou criticas à forte pressão do mercado e do capital para ampliar o consumo de alimentos e produtos industrializados e que, portanto esse assunto nao pode se restringir à responsabilidade exclusiva dos indivíduos e das famílias.
Para Ana Costa, presidenta do Cebes, que participou dos debates, o engajamento da CNBB na luta pelos direitos sociais, particularmente o direito à saúde é muito importante na reversão da situação atual onde predomina o setor privado e onde o SUS se reduz a um sistema de baixa qualidade para os pobres. “Para nós do Cebes, o seminário com a CNBB reafirma a necessidade de ampliar nosso diálogo com outras comunidades e movimentos sociais na luta pelo direito à saúde. Foi por isso que atribuímos grande importância a esta parceria que já se iniciou há algum tempo e que certamente, depois deste seminário, se fortalecerá”, afirmou Ana.
O produto do seminário que recomendou mais regulação sobre o mercado da saúde, mais financiamento, maior qualificação e humanização do SUS, melhor gestão e participação social em um contexto de um projeto de desenvolvimento pautado nos direitos sociais, será objeto de distintas cartas que serão elaboradas por uma comissão constituída no evento, que serão entregues à Presidenta Dilma, ao Ministro da Saúde, ao STF e ao presidente da Câmara dos Deputados. Salientado que o seminário também formulou algumas indicações para a Igreja, Guilherme Delgado, economista e assessor das Pastorais Sociais disse “Percebemos que há ações que são internas às comunidades, e outras devem ser dirigidas aos poderes públicos, especialmente ao Governo Federal, ao Congresso Nacional, ao Poder Judiciário”.
Para o Cebes fica o desafio de construção de pontes possíveis nos diversos âmbitos de nossa atuação, seja na Direção Nacional, seja nos Núcleos, para fortalecer e ampliar a mobilização em torno da democracia social, dos direitos sociais e da saúde.