A utopia da Reforma Sanitária Brasileira

De Rogério Cosme Silva Santos (1) e Tiago Parada Costa Silva (2)

O presente artigo procura analisar o conteúdo da conferência proferida pelo professor baiano Jairnilson Paim, no IX Congresso Brasileiro de Saúde Coletiva, realizado em Recife (PE). Traz à baila discussões sobre a importância do pensamento utópico na definição de um novo paradigma no campo da pesquisa acadêmica, proposto por diversos autores, visando à práxis em favor da consolidação do Sistema Único de Saúde (SUS) e do resgate de princípios e condutas que nortearam o processo da Reforma Sanitária Brasileira (RSB), como conquistas da sociedade organizada.

1.Construindo o cenário

No Teatro Guararapes, localizado no Centro de Convenções de Recife, no dia 04 de novembro de 2009, durante o IX Congresso da Abrasco, o professor baiano Jairnilson Paim, inspirado na composição musical de Torquato Neto e Jards Macalé, caminhou lentamente em direção ao microfone, de onde propôs-se a ‘desafinar o coro dos contentes’. Em pauta, o tema ‘Reforma Sanitária Brasileira: uma promessa não cumprida?’.

Destaca-se que esta preleção ocorreu um dia depois do discurso proferido pelo presidente Lula, no mesmo lugar. O teatro, cujo nome retrata uma batalha historicamente importante no contexto da emancipação brasileira, tem capacidade para assentar 2.405 pessoas e acomodou gente pelas escadarias laterais e centrais, todos curiosos para ouvir a conferência polêmica e esclarecedora de um dos mais críticos e ativos sanitaristas da atualidade no que concerne à ‘ideia’, ao ‘movimento’, à ‘proposta’, ao ‘projeto’ e ao ‘processo’ da Reforma Sanitária Brasileira (RSB).

Fato intrigante, uma vez que, durante o congresso, somente o presidente Lula teria enchido o plenário daquele modo. Mas, naquela manhã de quarta-feira, algo ensaiava ser diferente, ampliando o interesse das pessoas, visto
que, em 2009, o Conselho Nacional de Saúde e o Ministério da Saúde, juntamente com as entidades representativas dos secretários municipais e estaduais de saúde, organizaram as caravanas em ‘defesa do SUS’, com a participação dos estados. Defender o SUS do quê? De quem? Que novas e antigas ameaças rondariam esse sistema? Seriam essas indagações que o sanitarista poderia esclarecer em sua conferência?

Em pé, com as mãos sobre a tribuna posta do lado esquerdo do palco, que mede 1.050 m², por vezes, com a sua perna esquerda flexionada para trás do joelho direito, aparentando, com esse gesto e pelo tom da voz, certa tranquilidade, Paim, ao discorrer sobre a ‘revolução passiva’ e sobre o ‘transformismo político’ que afeta a política de saúde no País, destilou, homeopaticamente, para uma plenária repleta, o referencial de um dos
seus mais recentes trabalhos: ‘Reforma Sanitária: Contribuição para a compreensão e crítica’.

Sob a luz do marxismo e das ideias de Gramsci, o preletor se permitiu buscar, como referencial, além de figuras de pensamento destacado no meio acadêmico, a inspiração textual e poética de Torquato Neto, Carlos Drummond de Andrade e João Cabral de Melo Neto, entre outros, resgatando a importância, ao mesmo tempo, do sonho, da abstração, da práxis, do pensamento e da ação como estratégias para explicar por que a reforma sanitária não avançou e se desfigurou no Brasil no transcorrer da redemocratização, a partir de 1985.

Paim analisou o modo como cada governo, na fase republicana, a partir de 1995, de Sarney a Lula, tratou a proposta da RSB, e o risco de um retrocesso na implementação do Sistema Único de Saúde (SUS), como uma conquista social e política.

Sua fala foi na direção do resgate de um sonho. Aquele contido no Manifesto da Reforma Sanitária, divulgado em Brasília, em 23 de novembro de 2005, reafirmando o compromisso com a saúde dos brasileiros. O sonho manifestado várias vezes pelo movimento do Centro Brasileiro de Estudos de Saúde (Cebes), do
qual é membro fundador.

Leia o artigo na íntegra clicando aqui e acessando a página 16 da nova edição da revista Saúde em Debate.

(1) Doutorando em Saúde Pública pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Professor da Universidade Federal da Bahia (UFBA)

(2) Mestre em Saúde Coletiva pela Universidade Federal da Bahia (UFBA). Sanitarista da Secretaria da Saúde do Brasil.

(3) Em 2009.